sexta-feira, 12 de maio de 2017

A SOPA E O CARANGUEJO


Dino de Alcântara

Quando Lourival resolveu passar uma temporada no Cujupe, a pretexto de umas merecidas férias, desejava duas coisas: descansar e reviver uma das melhores fases de sua vida: a infância, em que, com a liberdade de um bicho selvagem, brincava até se fartar naquelas matas. De cara, descartou o vaso sanitário. Queria alguma coisa que lhe lembrasse dos anos 50 e 60, em que usava um longo tronco de ingazeira para as necessidades fisiológicas. Por isso preferiu usar o mato. Mas logo percebeu que isso era anti-higiênico. Assim teve uma ideia: descer a famosa ladeira do Porto de Vevelha. Lá descobriu um enorme mangueiro, ideal para o que desejava. Subia na árvore do mangue, sem grudar os pés, e lançava seus excrementos na lama, longe de casa, o que era conveniente. No terceiro dia, percebeu uma coisa estranha: um amável caranguejo não deixava as suas fezes às moscas. Com suas afiadas patas, devorava tudo. Assim, quando a maré enchia, já não encontrava mais nada para levar. Um belo dia, depois de ter se fartado de um mingau de milho com bastante vinho de coco, teve um problema intestinal tão terrível daqueles que não há tempo nem para retirar a roupa. Ele saiu correndo, já imaginando que não conseguiria chegar ao destino. O fétido líquido já viajava a dezenas de centímetros por segundo. A qualquer momento chegaria com certeza aos fundilhos. Ao alcançar, no entanto, a árvore, o famigerado crustáceo sai da toca a mil, com suas patas afiadíssimas. Ao mesmo tempo em que fazia expelir a água podre, Lourival foi logo avisando, de dedo em riste na direção do animal:

— Epa! Nem vem de garfo, cumpade, que a comida hoje é sopa!

Um comentário: