quinta-feira, 13 de abril de 2017

O CAÇADOR, O CURUPIRA E O PORCO-DO-MATO

Numa sexta-feira de agosto de 19.., Ludegero preparou sua espingarda e saiu para a Ilha Grande, atrás de uma boa caça. Sua esposa até lembrou que era um dia perigoso para sair assim de noite, mas o pobre homem retrucou, dizendo que no Apicum da Ilha Grande havia muitos rastros de porcos, e dos grandes. E assim, já quase com o sol se escondendo no Marindiua, Ludegero rumou para a caçada. Já planejava mandar preparar um vinho de coco para botar no cozido.
Quando chegou ao ponto em que deveria esperar, examinou bem o lugar, viu que os porcos estavam em grande quantidade. Subiu no mutá (espécie de armação em que o caçador fica à espreita das presas) e esperou.
Aqui e ali uma imagem percorria o olhar do homem. Vez ou outra, precisava mudar o rumo do olhar, para que o cabelo não se arrepiasse.
O tempo passava como se cada minuto demorasse cerca de duzentos segundos.
Até que, pela posição da lua, entre onze e meia-noite, passou um bando de porcos numa embalada, correndo como se estivessem fugindo de uma onça.
Não teve mais dúvida. O momento era este. Mirou no porco da frente, por duas razões: era maior e parecia mais gordo. Um disparo se ouviu no passagem, cerca trezentos metros de onde estava o nosso caçador.  O porco caiu bem à frente, cerca de uns vinte passos.
Ludegero ia descer para buscar a caça e rumar para o Itapeua, mas foi surpreendido com uma cena que o deixou paralisado: um vulto de gente, pequena, mas gente, algo em torno de 1m10.
O homenzinho foi até a árvore em que estava o mutá. Longa conversa (em que o narrador, por não ser onisciente, não pôde ouvir, nem entender patavina). Dez minutos depois, um Ludegero triste, acabrunhado, visivelmente derrotado, pôs a espingarda no ombro e cambou para casa.
Entrou em casa quase uma hora da madrugada, sem dizer nada à esposa. De manhã bem cedo, disse que fossem buscar o porco na Ilha Grande. Foleiro e Zé Domingo foram encarregados de buscar a presa. Durante o almoço, enquanto todos saboreavam um cozidão no vinho de coco, Ludegero mastigava chibé com camarão seco.
Nunca mais comeu porco-do-mato nem foi mais caçar.

No leito da morte, o compadre Feliciano bem que tentou arrancar o que tinha acontecido naquela famosa sexta-feira de agosto, mas Ludegero fez sinal que não poderia contar. E levou para o túmulo o que seria a única conversa entre um homem e um curupira na Ilha Grande.

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

O tralhoto e a palha

     Era um linda noite de lua cheia e céu estrelado no povoado Cujupe. Quando o relógio Oniret(versão do Orient muito usada pelos moradores dessa região) deu 18 horas em ponto, o grande astro do conto, o profissional Tralhato se levantou do mocho do qual passara a tarde toda acocorado vendo um de seus programas favoritos, o Caldeirão do Hulk. Pegou seu pedaço de barra de sabão azul e sua toalha e foi tomar um bom banho com direito a esponja do mato no couro para tirar o cieiro do corpo no poço que já foi considerado o com maior volume métrico de água do Itápeua. De banho já tomado, vestiu sua bermuda da Greenish e camisa da Pena e passou seu perfume Alfazema por toda a região do corpo e se TACOU para a festa. Festa essa que era por conta da Estrelinha do Som e comandada pelo DJ Célio Roots.
     Lá pelas 22 horas, tinha uma moça só de olho e marcando Tralhoto. Depois de longos 45 minutos esperando o homem trabalhador chegar junto dela, a moça que é popularmente conhecida como Bofó, resolveu ir ao belo jovem, convidando-o a dançar.
     Ela vendo que o já não tão jovem rapaz não ia dá o passo seguinte, pediu que à acompanhasse até o bananal para que ela pudesse liberar a cerveja que estava presa em sua bexiga. Ficou totalmente nua e perguntou se ele não queria cometer o pecado com ela. Tralhoto prontamente inclinou a cabeça como se fosse um sim.

Bofó - Você não vai pegar pelo menos umas pindovas para colocar no chão pra gente não sujar nossas roupas de festa?
Tralhoto: Eu não, quem tá querendo curtar aqui é você.

     Depois desse curto diálogo, Bofó adentrou no bananal atrás de pindovas para fazer de tapete. Obteve sucesso e consumou o tão desejado ato. Voltaram para a festa e Tralhoto estava muito cansado para dançar.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Palavras e Expressões do Cujupe


 
Ao se deparar com uma foto dessa na Internet, um cidadão de Belém ou de Porto Alegre diria, com indignação, que "Em pleno Século XXI os animais continuam a ser maltratados, como se não fossem também criaturas de Deus!" 
 
Mas, em se tratando de um morador do Cujupe, o enunciado sairia bem diferente:
 
Morador do Cujupe: "Os cabocos estão ajojando um elefantinho. O bicho está todo peiado, que não pode nem se mexer, berrando que é um doido. Tem um caboco com uma vara na mão. Essa vara tem um esporão de arraia na ponta para tutucar o rabo do elefante. Os outros estão preparados para ajojar o bicho, caso ele queira sapatear."

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

O DOCE E O LICOR

Dino de Alcântara 

Quando Lázaro conheceu pela primeira vez a cidade de Alcântara, visitou a famosa lojinha destinada aos turistas, na subida do Jacaré.
ATENDENTE — Bom dia, moço! Deseja alguma coisa?
LÁZARO — Como se chama esse doce?
ATENDENTE  — É Doce de Espécie.
LÁZARO —  Pois me dê um, que eu quero provar!
ATENDENTE (Entrega a Lázaro o doce.) - Tome! É uma delícia!
LÁZARO (Devolve o doce.) - Não. Me dê um licor de jenipapo. Dizem que aqui tem o melhor licor do Maranhão.
ATENDENTE (Dá-lhe o licor.) - É excelente!
LÁZARO (Toma.) - Obrigado! É bom mesmo! Até logo!
ATENDENTE - Ei, moço, você não pagou o licor!
LÁZARO - Mas eu lhe dei o doce em troca.
ATENDENTE — Mas você também não pagou por ele.
LÁZARO - E por acaso eu comi?!

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

A ORIGEM DO POLÍTICO MARANHENSE


Dino de Alcântara

Quando os portugueses começaram a colonizar o que hoje se entende por Maranhão, um dos mais sagazes ladrões de Coimbra, para escapar da masmorra, aceitou transferir-se para o “quinto dos infernos”, como mais tarde seria a nação (re)significada pela boca nada pura da princesa Carlota Joaquina. Veio com a família (era o infeliz pai de três filhos) no navio que seguiria até Salvador, mas acabou desembarcando na Ilha do Maranhão (Upaon-Açu). 
Como era costume trazer toda espécie de animais domésticos, o homem trouxe gato, cachorro, porco, galinha, etc. 
Passados alguns anos, ele, que morava nas proximidades da Praia Grande, já conhecia muito bem a terrinha. 
Antes que o leitor seja tentado a crer que a origem dos políticos maranhenses seja esse pobre português, vamos mudar a cena. 
O gato que viera com a família de Portugal era um exímio caçador, mas havia um rato na casa que ele não conseguia pegar de jeito nenhum. Parecia até que o roedor sentia o cheiro de felino de longe. 
O gato, porém, teve uma ideia brilhante. Aproximou- se da toca e latiu como se fosse o cachorro. A imitação foi tão perfeita, que se uma cadela, no cio, estivesse nas proximidades da casa, sairia enlouquecida, mais veloz que o furacão Katrina, que devastou a cidade de Nova Orleans em 2005.
O rato, ao ouvir o latido, pensou: “O bicho não se une com o cachorro; isso quer dizer que ele está bem longe!” e saiu da toca. 
O gato abocanhou-o, mas não resistiu a uma boa gargalhada, deixando o indefeso animal com direito a uma última lição, infelizmente, para ele, desnecessária. O roedor queria saber quem tinha latido. 
O GATO - Eu! 
O RATO -  Mas com tanta perfeição?


O GATO —  Exato! 
O RATO — Eu nunca acreditaria que aquele latido era de um gato! 
O GATO — Ah, meu caro rato, nesta terra abençoada pela mentira, quem não aprender a enganar os outros passará fome! 

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

GREGÓRIO E O HOMEM QUE VIRAVA BICHO


Todos no Cujupe diziam nas casas de famílias e nas quitandas que Cento-e-Trinta virava bicho. Mas ninguém tinha até então uma prova dessa metamorfose, como dizia o professor Jonas. Quando bebiam na quitanda do Barbino, Gregório sempre dizia a  Cento-e-Trinta que, caso ele virasse lobisomem e aparecesse, iria montado num bichão para casa. E o famoso negro do Cujupe sempre ria, dizendo que um dia ainda ia montar em Gregório, como se monta num jumento. Gregório dizia que só no dia de São Nunca.
Certa feita, numa sexta-feira de agosto, vindo da quitanda, e passando na Campina próximo ao Guariba, Gregório viu um Jabuti enorme sobre o capim. Correu para o bicho,que nem se moveu, como se estivesse à sua espera. Examinou bem o animal e descobriu que era uma jurará ou uma campininga. Mas muito grande. Talvez uma tartaruga. “Não! Poderia ser um jabuti.” Examinou o casco com o facão de bainha. Tudo perfeito. Não teve dúvida: pegou o bichão, colocou no ombro e tocou para casa, no Itapeua. Quando chegou, pegou um chucho com ponta bem afiada e fez um furo no casco. Passou uma corda de embira bem resistente e amarrou num esteio para o bicho não fugir durante à noite. No dia seguinte, mataria o animal para comer. E foi dormir, certo de que, no dia seguinte, teria carne fresca para comer. Quem sabe até daria um quilo para Ziquié.
No entanto, ao amanhecer, Gregório teve um sobressalto. Viu a embira desatada, sem corte, que pudesse denunciar uma roída na embira. “O jurará desatou o nó-cego!” Não entendeu como a réptil transpôs o batente de quase 40 cm. Mas fazer o que... O certo é que ele tinha fugido. Foi-se a carne.
Dias depois, na quitanda, tomando grode, Gregório encontrou novamente Cento-e-Trinta. Depois de uns dois goles de Pitu e Jurubeba, o negro falou bem perto do ouvido do companheiro de grode:
 – Grigoru, tu ia mesmo me comer, Grigoru?

E pediu mais um grode para Barbino. 

A JOVEM CORCUNDA



Um jovem do Cujupe, muito tímido, mas com certa quantia no bolso, fruto de uma boa caeira, retirada com a preciosa ajuda de Pedro Leitão, contratou os serviços de um agente para se casar, nos idos de 1960. Dizia que, até então, não tinha pensado em matrimônio, “mas já era hora, não?” 
No dia aprazado, João Feliciano (era esse o nome do cidadão) embarcou numa canoa até São Luís, onde encontrou o agente. Foram apressadamente à casa da noiva, ávido que estava o agricultor para ver sua futura mulher.. 

Ao conhecer a família da noiva, no Goiabal, o encanto finou-se. Reclamou ao contratante:

O NOIVO —  Não gostei nem um pingo da sogra. Que mulher mais antipática! 
O AGENTE — Você não vai se casar com ela, vai? Quem você quer é a filha dela. Então?! 

O NOIVO — Sim, mas você tinha me dito que ela era jovem e bonita. Tô vendo que ela não é tão nova assim e nem bonita. 

O AGENTE — Não importa. Veja, meu amigo, se ela fosse bonita, você seria escorneado facilmente, não é verdade? De modo que, ela sendo feia, você não corre esse perigo. 

O NOIVO — Se pelo menos ela tivesse dinheiro... 

O AGENTE — Você vai se casar com o dinheiro ou com uma mulher? 

O NOIVO (Ao observar a noiva atentamente.) Ei, ela tem uma corcunda nas costas! 
O AGENTE — Bem, o que você quer mais? Não podia ela ter um único defeito? Assim já é querer demais.