O trânsito estava, como sempre
naquela hora, tenso. Uma Honda, dirigida por um boliviano de trinta anos,
carregava também um garupa. Na faixa dos vinte e cinco anos, esse flamenguista
tinha, ao contrário do piloto, um amplo conhecimento do que Zé Sarney chama de
maranhensidade. Tinham que contornar a Avenida Jerônimo de Albuquerque na
altura no Espetão. Era fácil. No entanto, muitos carros se espremem no sinal em
frente da Bela Napoli. O sinal está amarelo. O motoqueiro tem uma idéia, que
raramente é seguida por algum maranhense, sobretudo no trânsito: contornar logo
e entrar direto na avenida, sem o contorno ao lado da Convel. Mas eis que surge
um olhar, que mais parecia um radar. Um guarda da SMTT, escondido atrás da
parada logo acima, já preparadíssimo para, com uma caneta Bic, aplicar uma
multa severa no infeliz condutor daquela moto. Mas eis que surge um doutor em maranhensidade. A
mão esquerda, graúda (daria até para entrar no time titular do Maranhão
Handebol), tapou completamente a placa, deixando escapar apenas um H (do
início). Com a outra mão, o garupa, espremeu os quatro dedos, deixando o do
meio – também conhecido como médio (ou dedo do proctologista), totalmente à
mostra como uma espada em direção ao agente de trânsito. O homem da lei forçou
o mais que pode, mas não conseguiu enxergar as letras ou os números da placa.
Ficou furioso. Várias pessoas começaram a sorrir. Triste sensação essa em que
somos obrigados a engolir nosso ódio, sem poder saborear um gosto amargo (ou
doce) da vingança. Surge o ônibus do Cohatrac. O agente dá um sinal e entra no
coletivo. Entra sem dar bom dia. Vá pro inferno! Pensa. Já estava com minha
comissão. Droga! Mas à frente entra um garoto. Qualhira! Está com ódio. Ainda
por sina me deu o dedo! Desgraçado! E o ônibus, já sem assentos disponíveis,
desce a curva do noventa. Sai uma mulher e cruza a catraca. E ele se senta. Vai
pro corisco, cão. E olha para a moça. E o ônibus segue.
Nenhum comentário:
Postar um comentário