Dino de Alcântara
Raimundo Paiaco e o genro estavam remando em
direção à Boca Nova, perto do Igarapé da Passagem. Maré cheia, quase na
preamar. Uns guarás voando em direção à Ilha das Pacas e um taquiri sentado num
mangue vermelho pareciam observar os dois remadores. Tudo calmo. Até que um
macaco quebrou o silêncio daquela manhã. Desceu de um mangueiro até a maré.
Raimundo parou de remar e fincou os olhos no animal. O símio preparou-se para
atravessar o igarapé a nado. Mas um comportamento insólito chamou a atenção de
Raimundo: o macaco começou a nadar apenas com uma mão, como se a outra
estivesse quebrada. O remador se aproximou do animal para verificar de perto o
que estava acontecendo de fato. O braço esquerdo estava perfeito. Mas então por
que ele nadava só com uma? Pôs a mão na água para descobrir o porquê daquela
situação. Fez uma descoberta das mais estranhas: o macaco nadava com um dedo da
mão esquerda cravado do reto. Num relance Paiaco descobriu o sentido do gesto
do animal: certamente as pregas do ânus eram diferentes – não se fechavam, isto
é, não impediam a entrada da água. Raimundo fez um gesto brusco, segurando o
braço esquerdo do macaco. Ele resistiu, mas Raimundo foi mais forte. Com um
braço ocupado e com o outro usando para o nado, começou a afundar, ficando
apenas com os olhos e o nariz fora d’água. Paiaco esperou um pouco mais para ver
o que ia acontecer. Quando o animal já estava quase se afogando, ele puxou-o,
salvando-o. Ergueu-o, observando a barriga, que estava completamente cheia.
Deixou-o do outro lado do Igarapé, em segurança, num mangue, ralhando com o
pobre vivente, que ainda expelia água pelo orifício anal.
– Vai, cão. Tu num
presta nem pra gente comer. Bota água pelo feofó que nem cuia furada. Tá todo
isdrope*!* Isdrope (com I mesmo) significa pessoa que sofre de hidropsia (barriga d'água)
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