Dino de Alcântara
Dizem os moradores do Cujupe que quem tem vergonha
não envergonha o outro. Essa máxima, ou anexim, segundo Arthur Azevedo, rege os
ditames de relacionamento entre os mais velhos, deixando livres os mais moços,
uma vez que nenhuma regra comportamental consegue reger os arroubos da
juventude.
Depois de uma longa visita em nossas casas,
segundo os ditames, precisamos registrar um “está cedo!”, para dar a impressão
ao hóspede que a sua presença é essencial, mesmo que um bocejo insinue o
contrário.
Entretanto essas regras do bom comportamento foram
completamente deixadas de lado no almoço de aniversário da Branquinha. O pai e
o genro, não muito afinados, desde o dia em que Pedro Brasa se engraçou da
única filha de Chico Couro Grosso, sentaram-se cada um numa cabeceira da mesa, posta
no imenso quintal debaixo de uma mangueira rosa e uma jaqueira.
Chico Couro Grosso preparou-se à sua maneira para
esse almoço. Disse na véspera para Labicho que ia mais por causa da filha. Não
podia faltar, que pelo pilantra não ia coisa nenhuma.
Durante o almoço, o pai (ou sogro), sentado como
um abade, só mandando arriar o pato e o porco assado, mais arroz, macarrão,
feijão, purê de macaxeira, farinha d’água, salada, etc., ria alto, como se
estivesse não na casa do “pilantra”, mas na casa apenas da filha.
Já passava de uma da tarde, quando Pedro Brasa, já
satisfeito, porque abusou do suco de cajazinho e do refrigerante, percebeu que a
comida ia aos poucos se esvaindo da mesa. Sem atentar para o fato de estar
sendo grosseiro com os convidados e, sobretudo, com o sogro, levantou-se e fuzilou,
bem seguro do que ia dizer:
– Estou satisfeito! Eu e minha mulher. E assim
fará quem vergonha tiver!
Chico Couro Grosso, ouvindo esse disparo verbal,
que quase o fulmina, parou com a colher de arroz e um bom pedaço de pato bem próximo da boca,
olhou para o genro e vociferou:
– E como eu nunca tive e nunca hei de ter, daqui
só saio depois que a barriga encher!
E encheu a boca com a imensa colher!