sexta-feira, 2 de março de 2018

O BIG BROTHER DE SÃO LUÍS



  Dino de Alcântara
Depois das instalações de câmeras de alta precisão, os motoristas que trafegam em algumas avenidas na Ilha de São Luís devem se sentir como num Big Brother. Nas redes sociais, as informações dão conta de que até uma pequena visualização nas mensagens WhatsApp pode render uma multa severa. Assim, muitos motoristas temerosos começaram a dirigir da forma mais contida, com as duas mãos no volante, com cuidado no passar das marchas o mais rápido possível para que a mão direita retornasse à direção.
Valério sabia muito bem disso. Motorista experiente (mais de 12 anos de habilitação), tendo dirigido inclusive em Bacabal, Pinheiro e outras cidades maranhenses, estava atento a qualquer câmera de monitoramento.
Trafegando na Avenida Colares Moreira (cheia de câmeras), Valério grudou as duas mãos no volante. Firme. Passava marcha com rapidez. Ao passar em frente ao Tropical Shopping, ouviu o celular chamar com insistência. Conteve-se. Não atendeu. Mais adiante, perto da Clínica São Marcos, sentiu uma dificuldade de respiração na narina direita. Colocou o dedo mindinho direito para obstruir. Mas encontrou dificuldades. Tentou com o anelar. Em vão. Ao seu lado um agente de trânsito da prefeitura – com um olhar de águia. Parecia esfomeado, pronto para dar o bote em qualquer um que estivesse praticando crime nas avenidas de São Luís. Valério, irritado por ter tirado a mão do volante durante alguns segundos, perdeu a paciência e enfiou o dedo indicador para fazer a devida limpeza no nariz. Conseguiu. Teve que abrir a janela para jogar o lixo na via pública. Em se tratando de lixo, era quantidade desprezível.  Passou a respirar melhor, mas ficou visado pelo fiscal. Ao cruzar o Retorno do São Francisco, um piolho saliente começou a circular entre os fios de cabelo que ficavam na parte conhecida no Anjo da Guarda como coco – bem onde forma o redemoinho. Pensou em coçar, mas pressentiu que havia câmeras por toda a Avenida Castello Branco. Segurou até onde pôde. O piolho não dava tréguas. Parece que estava provocando. Valério não se conteve e com o dedo médio, com unha crescida, coçou gostosamente, expulsando-o da região sensível. O guarda, ao lado, não perdoou o gesto. Por duas vezes, o motorista havia retirado a mão direita do volante para gesto desprezível, isto é, sem importância. Anotou a placa do veículo, consultou rapidamente o celular para ter certeza e viu: “Art. 252. Dirigir o veículo: V - com apenas uma das mãos, exceto quando deva fazer sinais regulamentares de braço, mudar a marcha do veículo, ou acionar equipamentos e acessórios do veículo...”. O agente sorriu satisfeito. Aplicou a multa. Ao cruzar a Ponte do São Francisco, Valério colocou as duas mãos no volante – seguro que estava. Vinha pensando. “Hoje em dia, os otários de plantão vão ser multados a rodo. Quero ver me pegarem. Tem que ser velhaco no trânsito.”

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