Dino de Alcântara
Era para ser uma divertida pegadinha, mas quase se
transforma num pesadelo. Depois do 11 de Setembro, parece que fazer pegadinha
nos Estado Unidos era crime hediondo.
Lourival pegou o telefone público e tentou discar
o número da sua casa em São Luís. Discou o nove, já que seria a cobrar, o 1 que
acreditava ser um número internacional, mas ficou na dúvida e discou de novo.
Antes que discasse o próximo, ouviu uma voz doutro lado da linha, falando um
inglês rápido demais para entender. Percebeu tudo. Tinha discado alguma coisa
errada, por isso, colocou novamente o telefone no gancho e saiu
sorrateiramente. Em menos de trinta segundos, o telefone tocou. Várias vezes.
Ele ficou com receio de atender e receber uma intimação. Afastou-se uns cinco
metros. Novamente o som do aparelho. Lourival se afastou mais um pouco. Ficou
próximo a um a uma loja.
Dez minutos depois, estavam dois carros da polícia
no local. Saíram dois homens bem armados de cada viatura. Procuram em volta
algum indício de crime, mas não encontraram nada. Nesse momento, Lourival teve
a certeza de que estava num país diferente, em que os policiais levaram a sério
o seu trabalho. O maranhense ficou tremendo, com receio de que descobrissem o
seu grave delito. Felizmente tudo terminou bem. Não encontrando nada de
anormal, os policiais entraram nas viaturas e foram embora. Lourival depois
descobriu que havia discado, sem querer o número que no Maranhão seria o 190,
e, mesmo sem dizer nada, a polícia entendeu que poderia ser um assalto e foi averiguar.
Um mês mais tarde, já acostumado a sua vida na São
Luís, depois de uma viagem aos Estado Unidos (Flórida e Nova Iorque), Lourival
se deparou com uma situação que o fez desejar ardentemente ter aqueles policiais
americanos por perto: um assalto numa casa de sua rua. Foi fácil perceber. O
portão de alumínio aberto, carro estranho parado na porta, quatro homens tinham
entrado. Da sua janela, ele havia observado tudo. Não se enganara. Era um
assalto. Correu ao telefone. Nem tentou o celular. Pegou o fixo e discou rápido
o 190. Do outro lado da linha, no Ciops (que mais tarde descobriu o que
significava), um rapaz lhe atendeu.
– Senhor, está tendo um assalto aqui no Vinhais!
– Boa noite, senhor. Em primeiro lugar, mantenha a
calma. De que se trata?
– Um Assalto aqui no Vinhais, na Rua 15, perto da
Delegacia.
– Sim. Assalto. O senhor pode me dizer se é
assalto à residência ou a pedestre?
– Residência. São vários homens armados. Estão
dentro da casa, com várias pessoas lá, criança, tudo. Pelo amor de Deus, mande
rápido uma viatura.
– O senhor pode me dizer se estão armados?
– Lógico! Você acha que vão entrar na casa dos
outros desarmados?
– Senhor, mantenha a calma. Não precisa se
exaltar.
– Sim. Estou calmo. Mas o pessoal da casa deve
está em pânico!
– Eu entendo, senhor. Sabe me dizer se eles
chegaram dentro do carro dos moradores ou chegaram em outro automóvel?
– Vieram em outro, seguindo os moradores. Quando
eles abriram o portão, os assaltantes entraram também. Estão lá agora.
– O senhor sabe me dizer se os assaltantes
chegaram em carro tomado de assalto?
– Como vou saber, senhor? Sei lá, podem ter ido
primeiro comprar um carro para assaltar ou roubaram o primeiro que encontraram.
– Sabe me dizer a placa desse carro?
– PMB-1545
– É de São Luís?
– Sei lá. Veja aí no sistema se é carro roubado.
– Sabe me dizer se tem alguém dentro desse carro?
– Não tem.
– Certo. O senhor pode me dizer o endereço desse
assalto?
– Rua 15, casa número. Espera aí.... Casa 25.
– Ponto de Referência?
– Perto da Delegacia.
– Que delegacia?
– Como que delegacia? Do Vinhais. Só tem uma,
senhor.
– Pode me dar outro ponto de referência?
– Na polícia não sabem o que é GPS?
– O que, senhor?
– Nada, deixa para lá!
– Senhor, mais um ponto de referência.
– Quem entra no Vinhais, vem até a delegacia e
dobra a primeira à direita. Primeira rua depois da delegacia. A delegacia fica
à esquerda de quem entra no Vinhais. Essa rua é a primeira à direita depois de
passar pela delegacia.
– Sei. Obrigado, senhor, pelas informações. O
senhor quer se identificar?
– Pra quê? Para depois contaram aos assaltantes
que eu que denunciei. Não.
– Senhor, a denúncia é anônima.
– Ah! Eu acredito muito em vocês! Mas isso não
importa agora. Venham logo! Depressa, pelo amor de Deus!
– Senhor, fique calmo, estamos repassando essas
informações ao Batalhão Competente. Mais alguma coisa que o senhor queira
informar?
– Não, só isso! Só queria pedir pressa! Está sem
trânsito agora. Tem um carro da polícia bem no Elevado da Cohama. Se você
avisar esses policiais, eles chegarão aqui em menos de cinco minutos.
– Tudo bem, senhor. Boa noite. Obrigado
– Boa noite.
Depois que Lourival desligou o telefone, esperou
mais uns cinco minutos, nada de viatura chegar, os bandidos saíram da casa, com
vários pertences, incluindo eletrodomésticos grandes, como duas televisões, um
microondas, etc. Colocaram tudo no porta-malas do carro e saíram em disparada
pela principal avenida, sem nenhum medo de encontrarem uma viatura pela frente.
Passaram em frente da parada que fica defronte da Extra-Farma do Vinhais. Havia
seis policiais numa blitz destinada a
ônibus. Um dos homens da “briosa” ainda percebeu cinco malandros dentro do
carro de luxo e viu Bogea dentro. Comentou com um colega: “Olha quem estava
naquele carro: Bogea. Já saiu da cadeia. Vagabundo. Deve tá mentendo o bicho
aqui na área.” E se concentrou no trabalho: fiscalizar passageiros em ônibus
para conter a onda de assaltos a coletivo na Ilha. Enquanto isso, os criminosos
desceram a Curva do Noventa em direção à Ilhinha.
Uma hora e vinte minutos depois, com todos os
vizinhos dando os devidos apoios morais e psicológicos às vítimas (algumas com
sinais de espancamentos), chegou uma viatura para apurar e caso. Justificaram a
demora, dizendo que, assim que foram comunicados, vieram em disparada para lá.
Depois de ouvirem tudo das vítimas, fizeram uma recomendação: que fossem ao
Plantão Central fazer um B.O. Os moradores (quiseram esganar os policiais) se
contiveram e agradeceram a boa orientação.
No dia seguinte, o Secretário de Segurança Pública
do Maranhão estava dando uma entrevista no Balanço Geral apontando as causas da
redução da violência no Estado entre os anos de 2015 e 2017, em comparação ao
ano de 2014. Segundo o secretário, o governo vinha enfrentando a violência, com
equipamentos modernos contra a bandidagem, mais viaturas, policiais bem
treinados, uma rede de informação de primeiro mundo, dando mais agilidade às
ações policiais. Fechou a entrevista, dizendo que a polícia do Maranhão estava
equiparada às grandes corporações da Europa e dos Estados Unidos. “A Polícia do
Maranhão agora é uma das melhores do Mundo!”