domingo, 26 de abril de 2020

O FILHO QUE JÁ(MAIS) AMOU



Dino de Alcântara


Lourival Santos Costa, depois de sua fuga, em cima da Maria Fumaça, para Teresina, não teve como voltar à Ilha dos Amores, com receio de que fosse duramente castigado pelo pai. Da capital do Piauí seguiu, com o pessoal do Circo dos Sonhos, para Fortaleza. Depois de um longo período na cidade de José Alencar, a saudade da sua terra e dos seus entes queridos começou a fazer um estrago no coração do jovem do Cujupe. Essa saudade aumentava quando Lourival ouvia canções de Nelson Gonçalves, Dorival Caymmi, Vicente Celestino. Havia uma música que o encantava mais que as outras. Tinha uma letra bonita. Dizia “Eu jamais te esquecerei, nem que as estrelas deixem de brilhar!”. E ficava repetindo a palavra jamais. Jamais. Mas não sabia o que significava. Então procurou um senhor, que parecia um velho sabido e fez a procura. O velho lhe disse: “Jamais significa para sempre!”. Lourival repetiu: “Jamais.. para sempre”. Ficou o dia todo com a palavra na boca. Que palavra bonita! No mesmo dia, de noite, na pensão em que morava, de nome Marajá, de dona Maria do Carmo, conhecida como Mariinha, escreveu uma longa carta para o pai, que morava na Madre Deus. A missiva aludia ao pecado da fuga, o destino, o trabalho, a dureza, o sofrimento e, finalmente, a saudade. Pedia perdão pelo desatino e concluía dizendo que precisava voltar para os seus. O fecho da carta tinha uma frase primorosa: Meu pai, hoje tenho certeza: eu jamais lhe amarei.

segunda-feira, 20 de abril de 2020

LOURIVAL E A VIAGEM DE TREM



Dino de Alcântara

Lourival Santos Costa, interno da Escola de Aprendizes Artífices do Maranhão, mais tarde Liceu Industrial de São Luís (hoje IFMA), no início dos anos 40, teve um grande sobressalto, ao conhecer uma linda menina, filha de um dos sócios do Circo dos Sonhos, instalado para as bandas do Diamante. Foi uma paixão fulminante, dessas que não nos deixam outra saída, senão o enfrentamento. Ia todos os dias ao circo para ver a musa. À noite, com o coração em prantos, imaginava o dia em que não a veria mais, já que a arte circense é mambembe: hoje está numa cidade, amanhã pode estar em outra. Até que num sábado de setembro, ao chegar ao Diamante, encontrou apenas o local em que estava armado o circo. Nem sinal da Amélia, a menina do olhar feiticeiro. Descobriu, através de uma moradora do bairro, que tinham ido para o Piauí na sexta-feira, no trem São Luís-Teresina. Passou dias e noites tentando encontrar uma forma de viajar ao sertão, atravessando o rio Parnaíba.
 Assim, depois de uma fuga exitosa, das janelas da escola federal, Lourival tomava o trem de passageiros em direção à Teresina. Como não conseguiu com os amigos, nem com o maquinista o dinheiro necessário para a viagem, foi em cima de um dos vagões. Ao chegar à Estação Ferroviária de Teresina, o jovem do Cujupe desceu com as costas em petição de miséria, tanto que teve de ser levado a um hospital, dadas as queimaduras nas costas, com as faíscas da famosa Maria Fumaça. Sem ter lido o romance de Victor Hugo, Trabalhadores do Mar, agiu como Gilliat: enfrentou mares e fúrias (no caso de Lourival: sacolejos, fome, sede, sol, frio, queimaduras, etc.) em nome de uma paixão, que, aliás, nem durou dois meses.